O Brasil está no epicentro global da fome, junto com Índia e África do Sul, segundo o documento da Oxfam.

 

São Paulo, 11 de julho de 2020
Nº 008/20 – semana 2

 

Síntese: As empresas multinacionais transferiram mais de US$ 1 trilhão para paraísos fiscais, segundo estudo. A América Latina e Caribe passam pela pior crise econômica e social com impactos inéditos no emprego e aumento da pobreza, de acordo com a nota da OIT. Já nos países da OCDE, a preocupação é com o aumento da pobreza e desigualdade diante da pandemia. China e EUA mostram recuperação econômica com as atividades do setor de serviços no mês de junho. No Brasil os dados para o mês de maio e junho apresentam certa recuperação da economia, mas ainda dentro de um quadro de retração geral no ano. Os investimentos cresceram 28,2% em maio, a atividade nos serviços caiu -0,9% e o varejo cresceu 13,9% no mesmo mês. No mercado de trabalho houve uma queda de -32% de pedidos de seguro-desemprego no mês de junho. Na indústria, o consumo aparente de bens industriais cresceu 3% no mês de maio, e a produção de carros no mês de junho subiu 129,1%. Até 12 mil pessoas podem morrer de fome por dia no mundo, até o final do ano, em decorrência da pandemia do Covid-19. Isso é mais do que o total de mortes diárias causadas pela doença em si.

 

INTERNACIONAL

1. A América Latina e Caribe atravessam uma crise econômica e social sem precedentes, que trarão impactos inéditos no fechamento de postos de trabalho ou sua deterioração da qualidade, com redução da renda e aumento significativo da pobreza. A avaliação é da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre o Panorama do Trabalho em tempos de Covid-19, que aponta que a taxa de desocupação aumentará em 4% para a região, saindo de 8% para 12,3%, podendo chegar a 41 milhões de pessoas. A OIT também destaca quatro políticas que os países devem tomar para enfrentar esse período: estimular a economia e o emprego com uma política fiscal ativa; apoiar as empresas, o emprego e a renda com medidas de proteção social à população e manutenção do emprego; proteger os trabalhadores no local de trabalho e; buscar soluções mediante o diálogo social, com o fortalecimento das organizações dos trabalhadores e empregadores.

2. Para a OCDE, a pandemia disparou a pior crise no emprego desde a Grande Depressão de 1930. A real preocupação hoje é com o crescimento da pobreza e da desigualdade. O impacto nos empregos foi 10 vezes maior do que da última crise financeira de 2008/2009. A taxa de desemprego para os países da OCDE era de 8,4% em maio. Esse número é ainda maior para os jovens (17,6%) e mulheres (9,0%). As medidas de proteção aos trabalhadores implementadas pelos países cobriram uma média de 24,9% desse contingente. As políticas adotadas pela Nova Zelândia cobriram 66,6% do total dos trabalhadores. Na outra ponta, as políticas dos EUA cobriram apenas 0,14% da população economicamente ativa.

3. Na China, o índice que mede a atividade do setor de serviços, Índice de Gerenciamento de Compras – PMI, feito pela consultoria Caixin, apresentou uma alta de 58,4 no mês de junho, superando as expectativas do mercado. Foi um aumento de 3,4% em relação ao mês de maio. Quando o índice se encontra acima de 50,0 reflete que a atividade está em expansão, e abaixo desse valor reflete retração econômica. Esse índice capta a movimentação da atividade nas pequenas e médias empresas, diferente do índice oficial que capta a movimentação nas grandes corporações. Nos EUA, o Índice de Gerenciamento de Suprimentos (ISM) não industrial subiu para 57,1 em junho, passando dos 45,4 no mês de maio. Os novos pedidos saltaram para 66,0, mostrando uma tendência de recuperação da economia.

4. As empresas multinacionais transferiram US$ 467 bilhões para paraísos fiscais, ocasionando prejuízos fiscais de US$ 117 bilhões, segundo a ONG Tax Justice Network a partir da análise dos dados fornecidos pela OCDE de 15 países. A análise mostra que, em vez de declarar lucros nos países onde foram gerados, as empresas multinacionais estão transferindo mais de US$ 1 trilhão para paraísos fiscais.

 

CRESCIMENTO ECONÔMICO BRASILEIRO

5. Os investimentos apresentaram crescimento de 28,2% no mês de maio em relação ao mês de abril, segundo o Indicador de Formação Bruta de Capital Fixo do Ipea. Apesar desse resultado, o trimestre móvel (março/abril/maio) fechou com uma retração nos investimentos de -20,6%. Comparando o mês de maio ao mesmo mês de 2019, a retração foi de -19,6%. Dos elementos que compõem o Indicador, o consumo aparente de máquinas e equipamentos – quantidade de máquinas produzidas no país para uso interno somado às importações do mesmo produto – teve um crescimento no mês de 68,7%.

6. A Pesquisa Mensal de Serviços (PMS) mostrou uma diminuição de -0,9% no volume de serviços em maio comparado ao mês de abril; no acumulado do ano a queda é de -19,7%. As atividades de serviços prestados às famílias, que engloba estabelecimentos como restaurantes e hotéis – e que apresentaram uma queda de -44,1% no mês passado -, tiveram um crescimento de 14,9% em maio. Nesse mesmo mês, o setor de profissionais, administrativos e complementares, e serviços de informação e comunicação, apresentaram queda de 3,6% e 2,5%, respectivamente.

7. Já a Pesquisa Mensal de Comércio (PMC) inverteu a curva de baixa e apresentou um crescimento de 13,9% no mês de maio comparado a abril. Contudo, o crescimento foi insuficiente para cobrir as quedas dos meses anteriores, registrando no acumulado do ano uma retração de -3,9%.  Todos os setores apresentaram crescimento com destaque para o de Tecidos, vestuário e calçados (100,6%), de Móveis e eletrodomésticos (47,5%) e outros artigos de uso pessoal e doméstico (45,2%).

8. As vendas no Brasil atingiram o maior patamar do ano no mês de junho com um crescimento de 15,6% em relação a maio, e 10,3% em relação ao mesmo mês do ano anterior, segundo o Boletim da Receita Federal – Impactos da Covid-19, a partir da leitura das emissões de Nota Fiscal eletrônica no período.

9. O desmatamento na região da Amazônia apresentou uma alta de 21% de janeiro a 25 de junho deste ano, comparado ao mesmo período do ano anterior. Com isso, o Ministério Público tem aumentado a pressão sobre o Ministério do Meio Ambiente, de Ricardo Salles, e o Conselho Nacional da Amazônia Legal, presidido pelo vice-presidente Hamilton Mourão, ao pedir o afastamento do ministro da pasta. Os fundos estrangeiros também demonstram insatisfação ao apresentarem dificuldades em investimentos no Brasil com esse quadro.

10. As medidas de socorro do governo federal, como o auxílio emergencial e a ampliação do programa Bolsa Família, podem amenizar a queda do PIB em até 4,21 pontos percentuais, caso o governo disponibilize os R$ 257,2 bilhões previstos no ano. Ao menos é o que afirma o estudo da UFRRJ (Pós-graduação em Economia Regional e Desenvolvimento), ao apontar que esses recursos têm um impacto instantâneo na demanda pela alta propensão marginal a consumir das famílias de baixa com acesso a essas medidas. Caso o governo transfira o valor total previsto, a arrecadação federal pode chegar a R$ 78,8 bilhões com impostos e tributos.

 

CRÉDITO, DÍVIDA E JUROS

11. Tem aumentado o acesso aos programas de crédito para enfrentar a pandemia do governo federal, já que os bancos privados estão destravando os bloqueios que tinham no início. O Pese (Programa Emergencial de Suporte a Empregos), que financia o custo da folha de pagamentos de pequenas e médias empresas, já atendeu 113.383 empresas com financiamento total de R$ 4,5 bilhões, embora este valor ainda esteja muito longe dos R$ 40 bilhões destinados ao programa. Foram mais de 1,9 milhão de empregados atingidos. O banco Itaú e o Santander são os que mais forneceram essa linha de crédito. Já o Pronampe (Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte) emprestou R$ 3,2 bilhões até o momento (a previsão é de R$ 20 bilhões até o fim do programa), sendo 61,3% para microempresas. Por enquanto, apenas o Banco do Brasil e a Caixa tem emprestado por essa via. A votação na Câmara dos Deputados da MP que institui o programa criou a opção do acesso ao crédito por meio das maquininhas de cartão, com facilidade para os MEIs.

 

CONTAS PÚBLICAS

12. A despesa com o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (BEm) pode ficar em R$ 26,1 bilhões. Este valor está aquém da projeção inicial do governo, de R$ 51,6 bilhões, segundo Nota Técnica da Instituição Fiscal Independente (IFI). Caso o benefício seja estendido por mais dois meses, seu custo sobe para R$ 43,8 bilhões. As despesas gastas até 30 de junho foram de R$ 17,4 bilhões, com a preservação de 11,698 milhões de empregos.

 

INFLAÇÃO E PREÇO DOS ALIMENTOS

13. A inflação no mês de junho medida pelo IPCA/IBGE foi de 0,26%, depois de uma queda no mês de maio de -0,38%. No ano, o índice acumula uma alta de 0,10%. O grupo de produtos de Artigos de residência teve alta de 1,30%, o de Alimentação e bebidas apresentou o crescimento de 0,38% e o de Transporte de 0,31%. O feijão-carioca teve uma alta de 4,96%, o arroz de 2,48%, o leite longa vida de 2,33% e as carnes de 1,19%. O tomate e a cenoura apresentaram queda de -15,04% e -8,88%, respectivamente.

14. A Petrobras anunciou mais uma alta do preço da gasolina nas refinarias de 5%. É a oitava alta iniciada desde o início de maio.

 

MERCADO DE TRABALHO E RENDA

15. Os setores de comércio, construção, alimentação e alojamento foram os mais afetados pela pandemia nos empregos formais até o mês de maio, segundo análise do Ipea, que buscou estudar heterogeneidade da queda nos setores da economia. Para esses setores, a queda nas admissões foi mais relevante que o aumento dos desligamentos.

16. O mês de junho contabilizou 653.160 pedidos de seguro-desemprego na modalidade trabalhador formal, representando uma queda de 32% em relação ao mês de maio, segundo o Ministério da Economia. No ano já foram contabilizados 3.950.606 pedidos de seguro-desemprego, um aumento de 14,8% comparado ao mesmo período de 2019.

 

EMPRESAS (INDÚSTRIA, COMÉRCIO, SERVIÇOS E AGRONEGÓCIO)

17. Segundo 13° Boletim trimestral das Empresas Estatais, apresentado pelo Ministério da Economia, o Estado controla 200 empresas, sendo 154 de controle indireto. No primeiro boletim havia 228 empresas estatais. Essas empresas apresentaram um lucro de R$ 109,1 bilhões em 2019, valor 53% maior que o lucro de 2018. No setor produtivo destaca-se o lucro da Petrobras, de R$ 51,9 bilhões. O lucro no setor financeiro foi de R$ 59 bilhões. No mesmo período, houve uma redução de 18,3 mil trabalhadores nessas empresas, tanto por conta dos programas de demissões voluntárias (PDVs) quanto pelos processos de privatizações.

18. Na indústria, a produção de carros subiu 129,1% no mês de junho, comparado ao mês de maio de 2020. Foram produzidas 98,7 mil unidades. Porém, quando comparado ao mesmo mês do ano anterior, a queda é de -57,7%, segundo a Anfavea. Já nas exportações, o crescimento foi bem maior, saindo de um patamar de 3,9 mil unidades em maio para 19,4 mil unidades no mês de junho. Já o segmento de Máquinas Agrícolas e Rodoviárias teve uma queda de -19,0% em junho, se comparado ao mês anterior. O setor de Máquinas e Equipamentos estima que o crescimento das vendas no ano de 2020 seja de 3% em relação a 2019, invertendo o último prognóstico de retração. Essa mudança deve-se aos resultados de junho. A Anfavea sugere que o governo estimule o consumo para amenizar a queda da economia, prevendo o risco de demissões em massa a partir de outubro com o fim dos acordos de redução salarial e de jornada.

19. Esses dados são reforçados pelo crescimento de 3% no mês de maio do consumo aparente dos bens industriais, com destaque para os bens duráveis (80,6%) e de bens de capital (68,7%), segundo estudo do Ipea. Ainda assim, no trimestre móvel terminado em maio a retração é de 16,9% comparado ao trimestre anterior.

20. No agronegócio, a exportação de carne bovina teve um crescimento de 18,9% em junho em relação a maio, e um crescimento 41% em valores de dólares e 28% em toneladas comparado ao mesmo mês do ano anterior, segundo a Abrafrigo. A China representou 57% do destino total do volume de embarques no acumulado do ano. O peso do país na receita das exportações no ano é de 60,5%; no ano anterior era de 38%.

 

ESPECIAL COVID-19

21. Até 12 mil pessoas podem morrer de fome por dia no mundo, até o final do ano, em decorrência da pandemia do Covid-19. Isso é mais do que o total de mortes diárias causadas pela doença em si. O Brasil está no epicentro global da fome, junto com Índia e África do Sul, segundo o documento da Oxfam: O Vírus da Fome: como o coronavírus está potencializando a fome em um mundo faminto. As mulheres são as que correm mais riscos de passar fome por conta da discriminação sistêmica, que as leva a receberem menos do que os homens pelo mesmo trabalho exercido.

22. Diante da expulsão de 2 mil famílias de suas casas pelo Estado brasileiro, especialista da ONU afirma que os despejos forçados são uma violação aos direitos humanos e aumentam a crise de saúde, ao não oferecer abrigo de emergência ou moradia de longo prazo. Dessa forma, ele pede pelo fim dos despejos no Brasil durante a crise da Covid-19.

23. O auxílio emergencial de R$ 600 do governo federal, distribuídos a partir de abril, evitou que 5,6 milhões de crianças passassem para debaixo da linha de extrema pobreza durante a pandemia, segundo cálculos da Fundação Getúlio Vargas/Ibre. De acordo com o estudo, 2,27 milhões de crianças estavam abaixo da linha da pobreza no mês de maio. Caso o auxílio emergencial fosse retirado, o total de crianças abaixo da linha da pobreza aumentaria para 7,9 milhões.

24. Até o momento, já foram liberados R$ 121,1 bilhões para o Auxílio Emergencial, com 173,5 milhões de pagamentos realizados e 65,2 milhões de pessoas beneficiadas, segundo a Caixa.

25. No monitoramento de gastos da União com o Covid-19, o Tesouro Nacional mostrou que já foram gastos R$ 216 bilhões (na semana passada foram R$ 211,4 bilhões) de uma previsão de R$ 506,1 bilhões (na semana retrasada era de R$ 404,2 bilhões). Os maiores valores foram com o Auxílio Emergencial a Pessoas em Situação de Vulnerabilidade (R$ 121,79 bi), Auxílio Financeiro aos Estados, Municípios e DF (24,9 bi) e Cotas dos Fundos Garantidores de Operações e de Crédito (R$ 20,9 bilhões).